A aquisição de imóveis é uma operação extremamente complexa e repleta de riscos que podem comprometer o sucesso da transação e, consequentemente, o patrimônio do adquirente. Por essa razão, é imperativo que o comprador adote uma série de medidas preventivas e de verificação, conhecidas como due diligence imobiliária, para garantir a segurança jurídica da negociação e proteger os seus interesses patrimoniais.
A due diligence imobiliária consiste na realização de uma análise minuciosa e criteriosa de toda a documentação relacionada ao imóvel e às partes envolvidas na transação, com o objetivo de identificar eventuais riscos, irregularidades e passivos que possam afetar a validade e a eficácia da compra e venda. Além disso, essa diligência também é fundamental para demonstrar a boa-fé do adquirente, um elemento crucial para a proteção jurídica em casos de litígios futuros.
Para conduzir uma due diligence eficaz, é necessário observar uma série de informações e documentos essenciais, que, de forma geral, podem ser classificados nas seguintes categorias:
1) Direito de Propriedade
O primeiro passo na due diligence é verificar o direito de propriedade sobre o imóvel, assegurando-se de que a transação está sendo realizada com o verdadeiro titular do direito real. No Brasil, a propriedade de um imóvel somente se consolida mediante o registro no cartório de imóveis, conforme dispõe a Lei nº 6.015/73. Portanto, é imprescindível obter a certidão de matrícula ou de transcrição do imóvel, dependendo da época do registro.
Com o documento em mãos, deve ser verificado o nome do proprietário e analisar se o imóvel transacionado está corretamente identificado na matrícula ou transcrição, conforme o princípio da especialidade objetiva do direito registral brasileiro. Qualquer discrepância na descrição do imóvel pode impedir o registro do título e exigir correções onerosas, como a retificação da matrícula ou a regularização de construções não averbadas.
2) Estado civil do Proprietário
A identificação do titular do imóvel deve ser minuciosamente conferida, considerando a situação civil e os dados pessoais atualizados do vendedor. Mudanças no estado civil, como casamento, podem impactar diretamente a negociação, exigindo uma análise detalhada das certidões de nascimento ou casamento para garantir a conformidade com o regime de bens aplicável.
3) Certidão de Ônus e Ações
A certidão de ônus reais é um documento essencial para verificar a existência de gravames que possam comprometer a propriedade do imóvel, como hipotecas, penhoras, ou ações judiciais que recaiam sobre o bem. Esta certidão deve ser atualizada e apresentada pelo vendedor, e a sua análise cuidadosa pode evitar a aquisição de um imóvel com ônus ocultos.
4) Validade do Registro
A validade do registro de propriedade deve ser avaliada não apenas com base no documento mais recente, mas também em toda a cadeia dominial que antecede o atual proprietário. A presunção de legitimidade dos registros imobiliários é relativa, o que significa que irregularidades ou fraudes em registros anteriores podem comprometer a titularidade atual. Recomenda-se a investigação da cadeia dominial nos últimos 10 anos, período no qual se aplicam as normas de prescrição previstas no Código Civil.
5) Existência de Débitos do Imóvel
Débitos propter rem, como taxas condominiais, IPTU e contribuições de associações de moradores, acompanham o imóvel, independentemente de quem seja o seu proprietário. A verificação desses débitos é crucial para evitar a surpresa de execuções futuras que possam comprometer o investimento. Documentos como a certidão de ônus, a CND municipal e declarações de quitação de condomínio e associações devem ser obtidos e analisados.
6) Existência de Débitos Pessoais que Recaiam sobre o Imóvel
A análise dos débitos pessoais do vendedor e dos antigos proprietários é um dos aspectos mais delicados da due diligence, uma vez que a existência de fraudes contra credores ou fraudes à execução pode resultar na anulação da venda e na perda do imóvel. Certidões como a de ônus reais, vintenária, de distribuidores e a negativa de débito fiscal são essenciais para identificar potenciais riscos e proteger o comprador de litígios futuros.
6) Aspectos Urbanísticos
Quando a aquisição do imóvel visa à construção, os aspectos urbanísticos assumem um papel central na due diligence. É necessário verificar se o imóvel está localizado em uma zona urbana que permita o tipo de construção planejada, conforme as normas de zoneamento e uso do solo do município. Documentos como a certidão de zoneamento e a consulta de viabilidade de construção são fundamentais para garantir que o projeto é viável.
7) Aspecto Ambiental
A legislação ambiental brasileira impõe uma série de restrições e obrigações que devem ser observadas na compra de imóveis, especialmente em áreas rurais ou em terrenos destinados a empreendimentos de grande porte. Certidões negativas de débitos ambientais e a verificação da regularidade do Cadastro Ambiental Rural (C.A.R.) são medidas essenciais para assegurar que o imóvel está em conformidade com as normas ambientais vigentes.
8) Patrimônio Histórico e Cultural
A compra de imóveis situados em áreas de preservação do patrimônio histórico e cultural requer atenção redobrada, pois o tombamento de um bem pode impor restrições significativas ao uso e à exploração do imóvel. Certidões de tombamento devem ser obtidas nas esferas municipal, estadual e federal para garantir que o imóvel pode ser utilizado conforme os interesses do comprador.
9) Posse
A análise da posse do imóvel é crucial para evitar conflitos futuros. Situações como invasões, posse prolongada por terceiros, e contratos de locação ou comodato devem ser cuidadosamente investigadas para garantir que o comprador terá pleno domínio e controle sobre o imóvel. Em certos casos, pode ser necessário propor ações judiciais para regularizar a posse antes de concretizar a transação.
10) Regularidade Administrativa – Habite-se, Alvarás
Por fim, a regularidade administrativa do imóvel deve ser verificada, especialmente no que se refere ao habite-se e a outros alvarás necessários para o uso e a ocupação do imóvel. A ausência desses documentos pode inviabilizar o uso do imóvel para determinadas finalidades e gerar custos adicionais para o comprador.
Considerações Finais
A due diligence imobiliária é um processo complexo e indispensável para assegurar que a aquisição de um imóvel ocorra de forma segura e sem surpresas desagradáveis. Cada aspecto abordado aqui deve ser minuciosamente analisado, com o apoio de profissionais especializados, para garantir que todos os riscos sejam identificados e mitigados. Assim, o comprador terá a tranquilidade de que seu investimento está protegido e que a transação será válida e eficaz.
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ELIZA MOURA NAVARRO DE NOVAES
Presidente da Associação Mineira dos Advogados do Direito Imobiliário – AMADI
Advogada especializada em direito imobiliário
e-mail: eliza@navarronovaesadvocacia.com.br – Tel. (31) 3567-7409